quinta-feira, 20 de setembro de 2012

EU E O OUTRO




“Cria o teu ritmo e criarás o mundo.”
Eu era adolescente quando li esse verso de Ronald de Carvalho. Pareceu-me de imediato uma chave para a poesia. Simples. Básico. Bastava-me criar o meu ritmo e eu seria poeta. Fácil, não? Ainda hoje estou tentando criar o meu ritmo, falar com a minha voz.
Há sempre um outro por trás. Talvez meu outro eu. A minha máscara – essa que todo poeta usa. Essa que, afinal, fala com a sua voz.
Dizem: o seu estilo é inconfundível. E me confundem, se confundem, não me reconhecem no que escrevo.
Como quando, certa vez, eu era jovem ainda, mostrei um pequeno poema de Drummond a umas amigas. Elas ficaram assim, assim. Como quem não sabia o que dizer. Então eu disse: “É de Drummond.” “Ah, bom”, disseram.
Não era apenas bom, o poema. Bom como eu não seria capaz de fazer. Tinha mais, tinha uma voz que não era a minha – mas se confundia com a minha em sua impessoalidade.
Impessoalidade. Contento-me lembrando Gide: Estilo é não ter estilo. O estilo ideal é não se denunciar por artifícios de linguagem, por enfeites, floreios, etc. A linguagem ideal é a que parece de todo mundo. Nem se percebe que por trás há o homem.
Por trás há o outro.
Eu é um outro, dizia Rimbaud. E Borges vivia brigando com o seu duplo.
Uma vez, faz trinta anos, criei um sósia: Gregório Vaz. Chamei-o de heterônimo, pretendendo uma despersonalização como a de Fernando Pessoa. Acabou ficando tão parecido comigo, que se o uso hoje é apenas como pseudônimo.
Afinal, qual é o meu estilo? Talvez eu tenha atingido o ideal de não ter estilo. Posso até me vangloriar: isso é para os grandes.
O outro sorri no espelho. Escárnio ou leve mofa.

José C. M. Brandão





Nenhum comentário:

Postar um comentário

Visualizações de páginas da semana passada