sexta-feira, 17 de junho de 2011

D'APRÈS OVÍDIO



 
Nem a morte anulará a minha obra.
Morrerá o meu corpo, morrerão os meus dias,
A melhor parte de mim, a minha poesia,
essa ficará, perene, inscrita no eterno.

A criação do homem é a sua essência
e essa ficará, além do tempo e da memória.
Como disse Camões, das leis da morte
com as leis da arte vou me libertando.



quarta-feira, 15 de junho de 2011

D’APRÈS GIUSEPPE UNGARETTI



INQUIETUDE


A uva apodrece, a terra quebra-se.
O monte cobre-se de urubus.

Cai a sombra do inverno
sobre as coisas.

Entre os meus dedos frios
a treva pesa.

As andorinhas morrem
com o meu desespero.



terça-feira, 14 de junho de 2011

D'APRÈS CECÍLIA MEIRELES


RETRATO

Eu sempre tive esta mesma cara,
meio séria, meio esquiva, meio ignara,
com os olhos vesgos
e a língua ferina.

Eu sempre tive estas unhas de arpão,
 feias e mortas de medo;
eu sempre tive este coração
de gelo.

Eu nunca mudei a minha dor:
sempre fui o mesmo vulto esconso
fiando na roca e no fuso
de um espelho obtuso.



domingo, 12 de junho de 2011

D'APRÈS MARIANNE MOORE


 PALAVRAS

Meu pai costumava dizer:
“Visita dá duas alegrias: quando chega e quando vai embora.”
Não que não gostasse de visitas: era o modelo do anfitrião,
Sempre um cavalheiro, orgulhoso de servir ao outro.
Não citava autores importantes, filósofos ou poetas
­­- embora conhecesse um ou outro poeta.
Para ele a poesia e a sabedoria – a mesma coisa, afinal –
Vinham da terra, da vida, dos homens convivendo com outros homens.
Supérfluo o conhecimento que vem dos livros,
Palavras que ficam, sem sangue, sem a presença do homem.
Meu pai nunca escreveria um poema: palavras vazias
Numa folha de papel, no bronze, no vago espelho do tempo.
O poema era o seu grito apartando as vacas, os bezerros
No final do dia, cansado e orgulhoso de existir.
E as visitas? Estamos na terra de visita
À espera da alegria da partida. Tudo é alegria, diria.


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