quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Fênix

As pedras caem sobre meu corpo.
O edifício desmorona sobre meu corpo.
Eu sufoco sob as pedras do edifício,
sob a terra, o pó, os ferros invisíveis
da grande pirâmide que cai sobre mim.

Que sou, sob essa montanha de pedras?
Que sou, que não respiro?
Eu, animalzinho indefeso sob o peso do mundo.
Eu, que não penso, já não sinto, objeto inútil
como qualquer objeto.
A grandeza humana evapora-se
quando você deixa de ser homem e é coisa
entre as coisas.

Você morre como uma fruta morre.
A fruta aduba a terra
e você aduba a terra
e isso é todo o sentido de ser fruta ou homem.

Morrer sem dar por isso foi o meu prêmio.
Morrer, mas eu voltei.
Não estava bem morto.
Sou o cara imperfeito
até na morte.

Ainda sinto as pedras caindo sobre mim.
Inerme como um pequeno inseto.
Insignificante como um pequeno inseto.

Sem dor,
sem nenhuma idéia na mente que se apaga,
sou o obejeto que se anula
porque objeto.

Eu soube que o mundo ruíra,
só muito depois eu soube que o mundo ruíra.
Um mundo de pedras desaba sobre meu corpo inútil.
Só muito depois me disseram: "Você está vivo,
cara."

Eu, que nunca me dera conta de estar vivo,
agora soube que morrera
e que estava vivo.

Agora que morrera,
eu estava vivo.

(Mas a chuva cai lá fora, longe do meu corpo,
inútil.
O espelho não me serve de nada,
é outrem quem eu vejo.
O meu cão lambe as mãos de outrem.
Eu me ajoelho diante do altar de um deus
de outrem, meu Deus,
eu que perdera a fé por desfastio,
ai, meus penates.)

________

Um comentário:

  1. José Carlos!

    Só a sua genialidade me faz sentir a morte em vida! Eu que por ela anseio. Perfeito!

    Beijos

    Mirze

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